terça-feira, 5 de janeiro de 2010

Imaginem se o governo Serra não estivesse trabalhando por nós...


Imaginem se o governo Serra não estivesse trabalhando por nós...


por Luiz Carlos Azenha

O período de chuvas tem sido revelador no Estado de São Paulo. Não consta que as chuvas tenham deixado de cair no chamado "período de chuvas". Revelador porque há uma clara desconexão entre o governo de São Paulo que aparece na TV e o governo de São Paulo que vemos, trabalhando por nós, no cotidiano.

Senão, vejamos.

Há indícios fortíssimos, levantados pela jornalista Conceição Lemes, de que o governo do Estado não fez o que deveria ter feito na obra que aprofundou o canal do rio Tietê: a limpeza cotidiana. A retirada da lama, das pedras e do lixo que os afluentes levam cotidianamente para o rio Tietê. O governo de SP talvez tenha ficado três anos sem limpar o Tietê. Resultado? Menos espaço para escoarem as águas de todos os afluentes e enchentes como as de novembro e dezembro últimos.

Fechando a barragem da Penha o governo paulista evitou novas inundações ao longo das obras de ampliação das marginais do Tietê, optando por encher os bairros da Zona Leste, inclusive o Jardim Romano, tomado por uma mistura de águas e esgoto que está lá há mais de trinta dias, como mostrou o Domingo Espetacular, da TV Record. Na mesma reportagem, um líder comunitário disse que o motivo das enchentes foi a construção recente de uma escola. Ora, como já se perguntou: porque a Prefeitura de São Paulo construiu uma escola e permitiu a construção de um conjunto habitacional em um bairro de onde agora quer tirar os moradores?

Por outro lado, temos uma situação bizarra em torno das obras que deveriam combater as enchentes: os piscinões. Como revelou Conceição Lemes, os piscinões de São Paulo recolhem tanto água de chuva quanto água de esgoto: sim, as redes de esgoto da SABESP caem diretamente nos córregos e os piscinões da periferia recolhem água desses córregos por um determinado período. Aquele bolo de cocô e xixi, misturado à água, deixa crostas de detritos que atraem ratos e baratas, de acordo com denúncias de moradores. Foram publicadas no Jornal da Tarde.

Outra obra questionada é a própria ampliação das marginais: segundo grupos que se opõem à ampliação, a obra reduz o espaço para infiltração das águas da chuva e levará mais automóveis para uma região sujeita às enchentes, ainda mais se considerarmos que o governo paulista não fez o que deveria ter feito para manter limpo o canal do rio Tietê; e professores da Universidade de São Paulo dizem que esse tipo de obra apenas repete a lógica de priorizar o automóvel, quando São Paulo tem apenas 61 km de metrô, contra 202 km da Cidade do México.

É possível imaginar qual o objetivo das obras do Tietê: quando chegar março e elas forem inauguradas, junto com mais um trecho do Rodoanel, seremos submetidos a um bombardeio ainda maior de comerciais na TV dizendo que o governo de São Paulo está trabalhando por nós, está criando milhões de empregos, promovendo o crescimento do Brasil, acabando com o efeito-estufa e garantindo a vitória do Brasil na Copa do Mundo. Mas não adianta trabalhar por nós desse jeito: com obras de caráter questionável, que certamente servirão para fazer propaganda eleitoral, mas que a longo prazo se revelarão inúteis, contraproducentes ou os dois.

Obras, é importante que se lembre, que financiamos não só com nossos impostos: São Paulo cobra pedágios de primeiríssimo mundo, como revelei depois de publicar os recibos de pedágio de uma viagem entre São Paulo-Bauru-São Paulo: 13 centavos por quilômetro rodado! Para fazer parte da viagem na rodovia Marechal Rondon, que está longe de ser de "primeiro mundo". Ganhamos em real, pagamos pedágio em euro!

Finalmente, chegamos a São Luís do Paraitinga, onde os moradores ficaram à própria sorte depois que uma enchente devastadora cobriu o centro da cidade. Não houve apenas atraso, mas completa descoordenação nos trabalhos de resgate e de ajuda aos moradores, como os próprios moradores denunciaram. Leia mais aqui, aqui eaqui. O governador José Serra chegou à cidade no domingo, trazendo os assessores e bombeiros que não estavam lá na hora da enchente -- e as câmeras de TV que o apresentaram no Fantástico.

O que me leva ao ponto final, que é essa completa desconexão entre obras de caráter duvidoso, falta de planejamento e improvisação de um governo que torra milhões de reais todos os dias para nos dizer que está trabalhando por nós, com nosso dinheiro, para fazer obras de caráter duvidoso, com falta de planejamento e improvisação. Ou seja, nós pagamos para que o governador paulista pague ao Ali Kamel para que o Ali Kamel interdite completamente o debate sobre questões essenciais ao futuro de São Paulo, esconda o que não interessa ao governo paulista e propague o que interessa.

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