quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

Falta bicheiro no carnaval de São Paulo?

São Paulo nunca foi o túmulo de samba. A famosa frase de Vinícius de Moraes é tremendamente injusta com Adoniran Barbosa, os Demônios da Garoa e outros expoentes do samba paulistano. Que é mais italianado do que o samba carioca, mas nem por isto menos samba.

Mesmo assim, São Paulo ignora essa gloriosa tradição e faz de tudo para imitar o Rio durante o carnaval. O desfile das escolas paulistanas emula em praticamente tudo o que se passa na Marquês de Sapucaí, com menos criatividade e bem menos dinheiro. O resultado é que elas acabam se parecendo, sim, com suas congêneres cariocas --mas de uns vinte anos atrás.

Agora, tendo em vista o que aconteceu ontem durante a apuração dos resultados, vou me arriscar a dizer que falta outra coisa ao carnaval de São Paulo: a influência dos bicheiros.

Deixa eu me explicar, antes que alguém me acuse de conivente com a contravenção. O que se viu ontem à tarde no Sambódromo do Anhembi foi uma explosão de anarquia, praticamente impensável no reguladíssimo carnaval carioca de hoje.

Um suposto dirigente da Império da Casa Verde (a escola nega, mas há fotos do sujeito na mesa da diretoria) invade a área dos jurados, rasga as notas e foge. Parte da torcida da Gaviões da Fiel resolve arrebentar tudo o que aparecer pela frente. E o mais patético: um diretor da Rosas de Ouro é pego em flagrante tentando roubar o troféu destinado ao 5o. lugar. Talvez para uso próprio, já que sua escola tinha garantida pelo menos a segunda colocação.

Dá para imaginar tal baderna acontecendo no Rio de Janeiro? Em outros tempos, sim. A Riotur escolhia mal os jurados do desfile, e os resultados eram invariavelmente contestados.

Marina Montini, mulata escultural e musa de Di Cavalcanti --atributos que de forma alguma a qualificavam para julgar o carnaval-- foi jurada certa vez, e dormiu durante o desfile. Chegou a ser ameaçada de morte, o que é até compreensível.

Ainda hoje a apuração carioca costuma terminar em polêmica, mas a violência que estourou em SP é mais do que improvável que aconteça por lá. E sabe por quê? Porque os bicheiros ainda dominam o carnaval do Rio de Janeiro. Mesmo atrás das grades, mesmo sem o poder avassalador que já tiveram um dia, são eles, os reis da loteria animal, que ainda dão as cartas.

E essa turma simplesmente não deixaria que uma controversiazinha na pontuação descambasse para um quebra-quebra generalizado. Porque uma confusão dessas não faz mal apenas para a festa: faz mal para os negócios.

Não sei quase nada sobre os dirigentes das escolas paulistanas, e não estou acusando ninguém de estar envolvido com jogo do bicho. Mas ainda falta a eles a omertà, o código de conduta da máfia, que seus colegas cariocas já conseguiram implantar há algum tempo.


O carnaval no Rio de Janeiro deixou de ser um espetáculo popular há tempos, exclusividade de uma emissora de televisão, é mais um produto a ser vendido, com a conivência do governo local com a influência dos bicheiros e a absurda alocação de dinheiro dos contribuintes.
São Paulo está fazendo força para se igualar.

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