terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

O bode expiatório

Não há dúvida de que as relações entre o Brasil e a China, apesar das vantagens globais que têm trazido para o Brasil, estão realmente desniveladas

Wladimir Pomar, Brasil de Fato

“Notícias do Estadão, apresentadas como vindas do Palácio do Planalto, apontam para divergências com a China. Semanas atrás, o Ministro do Desenvolvimento pareceu apontar na mesma direção, ao tomar as dores dos fabricantes de calçados e ameaçar a adoção de medidas protecionistas contra os sapatos chineses. Outras notícias, ainda relacionadas a sapatos e têxteis, falavam da desconfiança de que a China, para escapar das cotas estabelecidas pelo governo, estaria exportando seus produtos baratos através de triangulação com o Vietnã, Camboja e Malásia.

O Estadão também informou que o atual debate estratégico no governo Dilma, no sentido de elevar a competitividade nacional, na verdade estaria centrado em “conter a enxurrada de importações” chinesas. Ainda segundo tais informações, o governo Dilma estaria tendendo a adotar “tarifas dirigidas para produtos industrializados” da China, “uma fiscalização mais rígida nas alfândegas”, “mais processos antidumping” e “novas regras para mineradoras estrangeiras”, de modo a evitar que a China consolide “seu controle sobre as riquezas minerais brasileiras”.

O Estadão também deu espaço para Maurício Cárdenas, diretor do programa latino-americano da Brookings Institution, de Washington, segundo o qual o novo governo brasileiro estaria "buscando grandes mudanças” no rumo dos Estados Unidos, como parceiro mais confiável, o que teria “consequências para toda a América Latina, já que muitos outros países, experimentando os mesmos problemas” com a China, “devem seguir o exemplo do Brasil".

Para não dizerem que o jornal deixou de ouvir o “outro lado”, o Estadão transcreveu opiniões alertando que “redefinir a relação com a China é algo mais fácil na retórica do que na prática”. Simples: o comércio bilateral, de cerca de 2 bilhões de dólares, em 2000, se elevou para 56,2 bilhões de dólares, em 2010. Em outras palavras, “a China superou os EUA como maior parceiro comercial do Brasil” e, em 2010, foi a principal origem de “investimentos estrangeiros diretos, com cerca de 17 bilhões de dólares”. Isso teria ajudado a economia brasileira a alcançar o “crescimento mais expressivo em duas décadas”, incluindo aí um superávit comercial com a China de 5 bilhões de dólares.

Paralelamente, ministros do governo Dilma se reuniram, em São Paulo, com lideranças empresariais. Na prática, ouviram a pauta já cantada pelo Estadão. Porém, como era de esperar, explicaram que não é fácil adotar medidas protecionistas, nem acusar a China de dumping, sem levar em conta os dados globais do comércio bilateral, ou desprezar as regras estabelecidas pela OMC. Ainda paralelamente, o secretário do Tesouro e o presidente dos Estados Unidos anunciaram visitas ao Brasil, com alguns jornalistas insinuando que ambos gostariam de tratar com a presidenta Dilma de como enfrentar a China.

Bem vistas as coisas, Washington, empresários brasileiros descontentes e até FHC, que declarou o governo “ingênuo” nas relações com a China, formaram um coro para transformar a China no grande bode expiatório dos problemas do Brasil no mercado internacional. É verdade que a política de diversificação implementada pelo governo Lula ajudou a reduzir a dependência do Brasil aos Estados Unidos e Europa. Mas os Estados Unidos perderam a posição de maior parceiro comercial do Brasil por seus próprios problemas. Querer reverter a situação criando intrigas não é um bom caminho.

Em termos concretos, não há dúvida de que as relações entre o Brasil e a China, apesar das vantagens globais que têm trazido para o Brasil, estão realmente desniveladas. Mais de 80% das exportações do Brasil para a China são de minério de ferro, soja e algumas outras commodities minerais e agrícolas. No entanto, ao contrário do que insinua o Estadão, as exportações de minério não são realizadas por mineradoras chinesas no Brasil, mas fundamentalmente pela Vale.”
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