segunda-feira, 25 de agosto de 2014

Sabesp ignorou recomendações e afundou o Cantareira, diz especialista

Jornal GGN - O colapso do Sistema Cantareira, segundo inúmeros especialistas, pode ser considerado fruto de erros da Sabesp (Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo) associados ao longo período de estiagem. A atual crise já é a pior em mais de oito décadas de registro. Assemelha-se, apenas, ao biênio 1953/1954, conforme sugere a outorga do Cantareira de 2004.
Diferente daquele ano, a situação do subsolo das represas que compõem o maior sistema de abastecimento de água de São Paulo, hoje, é extremamente alarmante. A chuva que cair - e se cair - nos próximos meses precisará, primeiro, permear o solo seco antes de virar afluente.
É o que explicou, preocupado, o engenheiro e sanitarista José Roberto Kachel, na primeira parte da discussão sobre a crise de água promovida pela redação do Jornal GGN, ao lado do professor da pós-graduação em Planejamento de Gestão de Territórios da UFABC, Ricardo de Souza Moretti, e do jornalista Luis Nassif.
Segundo Kachel, que trabalhou por mais de 30 anos na Sabesp, uma análise da série histórica de vazões de afluentes do Cantareira mostra que a estatal retirou muito mais água do que o recomendado no final de 2013 e início deste ano. Isso contribuiu para que o sistema entrasse em colapso e o governo Estado, capitaneado por Geraldo Alckmin (PSDB), tivesse de decretar o uso do volume morto (reserva técnica).
“Até agosto do ano passado, a Sabesp praticou a retirada de margens abaixo do indicado. Mas a partir de setembro, Sabesp retirou vazões acima - 38 m³/s, quando o recomendado é até 33 m³/s. Em novembro e dezembro, ela tirou entre 12 e 13 m³/s a mais do que o critério recomendado. O manancial afundou! Se essa recomendação tivesse sido seguida, estaríamos hoje ainda com volume útil. O volume morto só seria utilizado no final de outubro”, pontuou. “Nos meus cálculos, pela regra de outorga na Sabesp, essa vazão tem que ser reduzida imediatamente para 16 m³/s”, acrescentou. 
Segundo Kachel, se a Sabesp continuar nesse ritmo, o Cantareira irá se esgotar em maio de 2015. Projeções do Consórcio PCJ indicam que o Sistema que abatece 8,8 milhões de pessoas, com o melhor dos cenários metereológicos, levará ao menos cinco anos para se recuperar dessa crise.
“O Alto Tietê está na mesma situação. Falaram de utilizar o volume morto. Que eu saiba, se tiver volume morto, deve ter coisa de 20 milhões de metros cúbicos de água, e não dá nem para o próximo mês. O Alto Tietê acabaria sem alternativas. Tomara que eu esteja errado”, concluiu Kachel.
Os riscos ambientais de secar um reservatório
Ricardo Moretti alertou para os riscos à saúde e ao meio ambiente a partir do uso de águas de um reservatório seco. Embora autoridades afirmem que a primeira metade do volume morto do Cantareira é completamente usável, Moretti sustentou que “começar a extrair água de fundo de reservatório é o que podemos chamar de caixa preta”. Ele citou o caso de mortes em um hospital pernambucano após uso de água de volume morto.
Kachel também afirmou que se a Sabesp retirar algo muito próximo ao fundo das represas, cenários semelhantes podem acontecer em São Paulo. A autarquia estadual já recebeu autorização para iniciar as obras de retirada das águas da segunda metade da reserva técnica do Cantareira. 
As chances de falta de água generalizada
Para Ricardo Moretti, a situação é “assustadora” no Estado, principalmente porque as pessoas “não imaginam que podem ficar sem água”. Segundo o professor, uma evidência de que a sociedade não está preparada para enfrentar uma situação de seca é a falta de plano B por parte dos municípios.
“Há pouco tempo, fizemos uma pesquisa tentando identificar as estratégias da defesa civil face à possibilidade de falta de água. (...) É impressionante como assunto está fora da pauta, porque ninguém considera a chance de que a gente possa não ter água. Há várias alternativas para se prevenir da falta de água e garantir abastecimentos mínimos em situações emergenciais, desde aproveitar pequenos mananciais, a água subterrânea e etc e tal. Essas pequenas medidas estão fora da pauta das companhias de saneamento, de forma geral", criticou.
Na próxima matéria, Moretti e Kachel discutem os problemas de saneamento no Estado, a limpeza de rios, os interesses da Sabesp e as alternativas para racionalizar o uso da água.
A redação convidou para o debate representantes da Secretaria de Estado de Recursos Hídricos e do Grupo Técnico para Assessoramento do Sistema Cantareira, que atuam face à crise. Sem sucesso, contudo.
Do: http://amoralnato.blogspot.com.br/2014/08/sabesp-ignorou-recomendacoes-e-afundou.html

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