quinta-feira, 12 de novembro de 2015

A lógica corporativa e o conceito de humanidade

"Vamos agora aos destaques sobre o desastre ambiental em Mariana", anuncia locutor de uma rádio de Belo Horizonte.

Aumentei o volume. Será que falariam sobre as consequências trágicas para a população da comunidade destruída pela lama? Abordariam as responsabilidades óbvias da Samarco/Vale? O que falariam sobr...

"A presidente Dilma Roussef foi vaiada em Governador Valadares durante viagem para visitar a região do desastre.", completou o sujeito.

Claro. Como posso permanecer ingênuo assim?

A lógica da mídia corporativa é clara: se há alguma questão envolvendo uma estatal, ataque a estatal; se envolve uma empresa privada, ataque o governo. Não é à toa que a maior parte das matérias produzidas pela velha mídia se concentra em desculpas em nome da Samarco/Vale: teria sido um abalo sísmico? A lama não era tóxica, vejam que bom. Acidentes acontecem; seria precipitado atribuir responsabilidade à EMPRESA RESPONSÁVEL PELA BARRAGEM QUE ROMPEU. 

Certo? Certo? Certo?

Por outro lado, se o heroico e ilibado juiz Moro diz que a Lava-Jato SUPÕE um valor de 40 bilhões de prejuízo no esquema (isso depois de - igualmente na base da suposição - chutar 20 bilhões), as manchetes imediatamente assumem o valor como fato a fim de martelar na cabeça dos leitores mais um dos vários boatos que visam enfraquecer a empresa a fim de facilitar uma eventual privatização (ou, no mínimo, uma abertura para a exploração de reservas por parte de empresas privadas estrangeiras).

A matemática do capital não é sutil, basta descobrir os olhos: as mesmas empresas que compram mandatos parlamentares com financiamento de campanha a fim de aprovar legislações que facilitam suas ações, desregulamentando o setor, agora contam com o apoio da mídia para tentar isentá-las de culpa ou para fazer um terrorismo acerca dos "prejuízos" que o PAÍS teria caso as multas e outras penalidades impostas pelo governo sejam severas demais.

Não à toa, semana passada o Diário de São Paulo, ao noticiar a queda no número de fatalidades no trânsito graças às medidas adotadas pela prefeitura de Haddad, mancheteou "Redução nas mortes do trânsito tem um preço alto".
Os sobreviventes e seus amigos e familiares discordam de que o preço seja alto.
Esta é a lógica corporativista: o lucro vale mais do que a vida. Uma lógica que, inacreditavelmente, muitos parecem adotar - tanto que já criaram uma página chamada "Somos Todos Samarco".

E a partir do momento em que um desastre provocado pela barragem de uma empresa que destrói toda uma comunidade desperta, como resposta, manifestações de solidariedade À EMPRESA... bom, podemos começar a repensar todo o nosso conceito de "humanidade".

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P.S.: Querem uma ilustração clara do que estou falando? "Deputados da comissão de barragens receberam R$ 587 mil de mineradoras" http://www.otempo.com.br/cidades/deputados-da-comiss%C3%A3o-de-barragens-receberam-r-587-mil-de-mineradoras-1.1164302

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