sexta-feira, 21 de agosto de 2015

Suplicy, o “chato da renda mínima”, tinha razão? Com a desigualdade subindo, o mundo começa a se render à ideia –mas não Dilma


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(Suplicy com participantes da operação Braços Abertos. Foto: Maria Eugênia Sá/Jornalistas Livres)
Eduardo Suplicy não caminha há seis meses sobre tapetes azuis no Planalto Central, rotina durante 24 anos de sua vida, mas sobre as calçadas e pedras do centro de São Paulo. Do Pátio do Colégio, onde sua cidade natal começou, à Cracolândia, de lá à zona Leste –onde for chamado. Suplicy parece ter perdido para ganhar: ser derrotado por José Serra na campanha à reeleição lhe proporcionou ser feliz no cargo de secretário de Direitos Humanos e Cidadania da prefeitura da cidade.
Nada como uma mudança de rumo, de ares, de rotina, aos 74 anos de idade. A excitação está estampada no rosto do ex-senador, sobretudo por se sentir útil no cargo, talvez como há muito não se sentia atuando em nosso pérfido Legislativo, povoado de Eduardos Cunhas demais e Eduardos Suplicys de menos. O secretário é acionado e costuma ir em pessoa resolver problemas relacionados aos Direitos Humanos: no início do mês foram os ataques xenófobos a tiros de chumbinho contra haitianos no bairro do Glicério. Suplicy também atende uma vez por semana no balcão da secretaria, aberto a qualquer morador com queixas. Enfim, o novo cenário caiu muitíssimo bem a Suplicy, e se nota.
Propus uma conversa com o secretário especificamente sobre o programa de renda mínima, após ler em vários sites internacionais (aquiaqui e aqui, por exemplo) notícias onde especialistas de vários países exaltam a ideia como uma solução possível para a crescente desigualdade no mundo. Eduardo Suplicy é citado em toda parte como um dos pioneiros em levantar a bandeira, embora no Brasil sua persistência em tratar do assunto tenha lhe rendido o epíteto de “o chato da renda mínima”. A rigor, Suplicy é o verdadeiro pai do bolsa-família: foi ele a primeira pessoa a falar sobre a necessidade de uma renda básica no Brasil e o primeiro político a aprovar projetos neste sentido.
Suplicy pode falar horas sobre o renda mínima, que é super-complicado de entender para um leigo, mas que significaria, em resumo, que todos passaríamos a ganhar o bolsa-família, cada um dos brasileiros, pobres ou ricos, sem a necessidade de explicar nada para o governo. Parece uma utopia, mas tem muita gente mundo afora apostando na ideia para diminuir o fosso entre as classes e mitigar o problema da fome. Para quem acha que é uma proposta (só) de comunistas, o presidente norte-americano Richard Nixon defendeu em 1969 algo bem parecido, que não vingou. Na verdade, há quem se refira ao programa como uma espécie de upgrade no capitalismo, um “aprimoramento”.
O espanhol Podemos, na Espanha, colocou no centro de seu programa econômico uma renda básica universal, e já foi copiado pelo rival PSOE, que prometeu uma renda mínima para os pobres, bem similar ao nosso bolsa-família. Na Holanda, a cidade de Utrecht anunciou que vai iniciar um experimento em setembro e foi imediatamente seguida por outras 30 cidades. Em 2016, a Suíça irá realizar um plebiscito para decidir se implantam um programa de renda mínima no país. Sem contar o clássico caso do Alasca, que se tornou o Estado mais igualitário dos EUA ao implantar o renda mínima em 1980.
Faz dois anos que Suplicy tenta ter uma audiência com a presidenta Dilma Rousseff para tentar criar um grupo de trabalho que discuta sua ideia, como está previsto na lei que criou o Renda Mínima, sancionada pelo presidente Lula em 2004. Suplicy está convicto de que chegou a hora de avançar além do bolsa-família e quer falar isso a Dilma. Dilma foge dele como o diabo da cruz. Eduardo Suplicy já chegou a ir a Brasília com tudo acertado e ela desmarcou de última hora. O petista não titubeou em reclamar do cano nas redes sociais.
Suplicy é um entrevistado rebelde, que só fala o que deseja, no tempo que quer. Não é fácil guiá-lo querendo objetividade nas respostas. Mas é curioso: quando fala do Renda Mínima, ele ganha ares e prosódia de mascate tentando vender alguns metros de tecido. Muda a cadência: fala tão acelerado que é difícil acompanhar.
Na saída, me deu um exemplar de seu livro Renda de Cidadania: A Saída É Pela Porta e cópias das 16 cartas que enviou a Dilma nos últimos dois anos. Um resumo da nossa conversa em seu gabinete no centro de São Paulo, com vista para o Pátio do Colégio (dias após, a secretaria mudou para a rua Líbero Badaró).
No: http://www.socialistamorena.com.br/suplicy-o-chato-da-renda-minima/

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